Oviedo

(dica: leia este post escutando Oviedo do Blind Pilot. Adoro essa música.)

Uma janela com vista para uma rua de paralelepípedos, com lojinhas no térreo e apartamentos nos outros andares. Poucas pessoas na rua e um pôr-do-sol no fim da rua. Há tanta coisa pra fazer, pra pensar. Mas estar naquela janela apenas observando era algo que você gostava de fazer. Sempre que eu acordava você estava sentada na janela fumando seu cigarro e olhando para a rua como se nem estivesse ali.
Nunca me preocupei em saber o que você pensava durante aqueles minutos. Nunca pensei em te atrapalhar. Você era bela até mesmo com a maquiagem do dia anterior toda borrada pelo rosto e aquelas camisas velhas de times de futebol que nem ao menos nós conhecíamos.
Seu apartamento tinha poucos móveis. Uma cama, uma mesa e duas cadeiras, um sofá de três lugares, uma geladeira e um microondas. Você nunca desfazia as malas e quando eu menos esperava, você já tinha viajado para outra cidade.
Partia sem deixar nenhuma pista pra onde tinha ido. E quando sentia minha falta, bastava uma ligação sua e eu já fazia o impossível para não te deixar esperando. Com o tempo, aprendi a ver os sinais que você deixava para eu perceber que já se aproximava o dia em que partirias para teu próximo destino. Mas durante todos esses anos, nunca consegui te surpreender mostrando que sabia aonde seria sua próxima cidade. E durante todos esses anos, nunca me senti abandonado ou usado por ti. Pois tu me ligavas em todos os momentos, compartilhando tudo comigo.
Antes de te conhecer, o tempo era meu pior inimigo. Cobranças, trabalho, aprendizado. Tudo isso e muito mais era uma corda em meu pescoço que me arrastava de um lado para o outro.
Em nossos primeiros meses juntos, achava que você era o exemplo de como deveríamos ser. Mas depois vi que não, você era apenas mais um ser humano nessa terra. Dotada de todos os sentimentos possíveis, expressando-os ao seu modo. Não seria justo te colocar em um pilar e te idolatrar. Você me fez ver isso. E de modo silencioso e sem intenção alguma, passou a ensinar-me a ser cada vez mais eu.

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3 Responses to Oviedo

  1. Ana :) says:

    Cá estou eu, comentando por livre e espontanea pressão.

    Gostei muito desse texto, e posso dizer que ele se tornou um dos seus que mais gostei até agora.

    É extremamente pessoal e extremamente aplicável a certos relacionamentos que vemos hoje em dia.

    A frase que mais me chamou a atenção foi "E de modo silencioso e sem intenção alguma, passou a ensinar-me a ser cada vez mais eu." e definitivamente foi a melhor forma de finalizar o texto.

    Está de parabéns, como sempre. :)

  2. Daniel Lira says:

    Quando vi que o nome do Post era Oviedo quando deu um chilique aqui. Lindo! E claro que segui a sua recomendação de ler ouvindo, até porque é sempre uma boa recomendação ouvir Blind Pilot!A-DO-REI!

  3. Nathy. says:

    Com exceção no finalzinho, eu li imaginando-o como uma capitulo de um livro sabe. Me deu gostinho de quero mais, essas coisas assim..

    Tu sempre linda.


    Agora que eu vi que vc escreveu sobre nosso blog :D
    Legalzão.


    >*